No século XIII, ao longo do
estuário do Tejo, tanto na margem direita como na margem esquerda, surgem pequenos
núcleos salineiros que se vão implantando na paisagem, pintando-a de branco. O
seu desenvolvimento ao longo dos séculos é marcado pela importância que adquire
nos circuitos comerciais tanto no mercado nacional como no internacional,
tornando-se fundamental para a vitalidade económica das comunidades locais.
Virgínia Rau no estudo que fez sobre as
salinas do estuário do Sado, também aborda o salgado de Lisboa, fazendo uma
referência curiosa acerca da forma como vão surgindo os primeiros centros
produtores na margem sul do Tejo associados ao aparecimento de pequenas
comunidades ribeirinhas. Refere a autora que, nos finais do séc. XIII no
estuário do Tejo, surge “uma poeira de
lugarejos que constituíam um grémio municipal rudimentar: o concelho do
Ribatejo. Nessa orla de terras baixas por onde o mar surgia ao longo dos
esteiros e dos ribeiros, quase toda entregue aos cuidados colonizadores da
ordem de Santiago, verificou-se o aparecimento de minúsculas póvoas
ribeirinhas, em grande parte para exploração de salinas, desde o segundo
quartel do séc. XIII, tais como: Montigio (1249), u samouco e Lançada (1241),
sarilhos (1304), aldeã dalcouxhete (1313), aldeã galega (herdade de Fernão Galego,
1306) e outras. Todas elas tinham por sede paroquial Sabonha (Sabona, 1249),
outro lugarejo situado numa pequena eminência entre Alcochete e Aldeia Galega.”
Segundo José Estevam, “ A comarca do Ribatejo era constituída no século XV pelo Concelho de
S. Lourenço de Alhos Vedros e pelo
Concelho de Santa Maria de Sabonha, este último composto da vila da Alcochete e
dos lugares de Aldeia galega, Samouco e Sarilhos.” A sede paroquial, funcionava na Igreja do mesmo
nome, implantada no local que mais tarde se viria a chamar S. Francisco. Como
lugar dominante, que era, aqui se construiu a primeira igreja, dedicada a Santa
Maria, símbolo por excelência da autoridade da povoação sobre o território
circundante.
“A vereação do concelho ou
freguesia de Sabonha constava de dois juízes ordinários, um vereador e um procurador.
Um dos juízes residia em Alcochete e o outro em Aldeia Galega”
No séc. XV, a ordem de S. Tiago dissolve o
concelho de Santa Maria de Sabonha e cria dois concelhos: o concelho de Aldeia
Galega (actual Montijo), ao qual junta o lugar de Sarilhos e o concelho de
Alcochete, integrando neste o lugar de Samouco.
Efectivamente, as zonas ribeirinhas,
nomeadamente aquelas que ofereciam condições favoráveis à fixação do homem,
constituíram um ponto de atracção humana, graças aos recursos que a terra e o
clima ofereciam. A exploração do solo era a principal fonte de rendimento destas
pequenas comunidades. O tipo de exploração que se fazia da terra dependia da
capacidade do homem para observar e interpretar a natureza, explorando a terra
da forma mais rentável possível. Daí que nas zonas alagadas, onde não era possível
desenvolver a agricultura uma vez que as águas das marés entravam através dos
esteiros ou dos rios, o homem dedicava-se à exploração do sal. Em muitas
situações os resultados foram vantajosos.
Por
isso, tal como outros estudiosos têm referido, o salineiro, marnoto ou marnoteiro,
antes de o ser, era em primeiro lugar agricultor, pois precisava de dominar as
técnicas para amanhar e cultivar aterra.
Precisava de conhecer a terra e
as plantas que aí podia cultivar. Este conhecimento obtido pela experiência acumulada
e transmitido de gerações em gerações constituiu o segredo que fez prosperar a
Indústria salineira nesta região, assim como noutras.
Desta forma, embora as
referências documentais provem a existência de salinas nas margens do Tejo, a partir
de meados do século XIII, construídas aqui e ali conforme as condições do
terreno e a habilidade do homem o permitiam, é muito provável que já antes se
produzisse sal nesta região. (…) Acerca da questão da antiguidade da indústria
salineira, esta seria a região que oferecia, desde tempos remotos, as melhores
condições para o desenvolvimento da salicultura. Segundo Lacerda Lobo, terá
sido nas margens do Sado e Tejo que se construíram e exploraram as primeiras
salinas, pelas seguintes razões: “1º as enchentes das marés nestas regiões são
mais consideráveis do que no Mondego e Ria de Aveiro; 2º o terreno é mais
apropriado para nelas se fazerem marinhas; 3º A extracção do sal é mais fácil
pela bondade faz barras de Lisboa e Setúbal. Estas vantagens, que a natureza
nunca negou a estes sítios, são motivos fortes, para nos persuadirmos, que os
nosso maiores talvez fizessem aqui primeiro Marinhas que em qualquer outra
parte”
Na margem esquerda do Tejo, as referências
documentais, sobre a indústria salineira, remontam ao século XIV, embora já
muitos anos antes, se produzisse sal. Só assim se justifica toda a documentação
relativa a contratos de arrendamento e de compra e venda de salinas, nesta
região, que os estudos de Virgínia Rau vieram demonstrar. No século XIV, a
margem sul do Tejo teria já uma produção bastante significativa, merecendo o
interesse e investimento de proprietários locais e especialmente de Lisboa.
Assim, em 1375 (16 de Outubro) Gil Vicente, prior de Stª Maria de Sabonha,
vende uma salina a Lopo Martins de Lisboa, situada num lugar chamado “pinhal do
Ribatejo”, onde se situava um dos centros produtores importantes desta região.
Virgínia Rau, refere um documento existente no
núcleo documental do Mosteiro de Chelas, no qual consta um contrato de
arrendamento de uma salina, em Aldeia-Galega, actualmente pertencente ao
concelho do Montijo, realizado entre Constança Afonso e Domingos Afonso,
morador nesta localidade, que segundo a autora “define usanças e normas que só
longos decénios de exploração salícola podiam ter estruturado”
Em 1429 (10 de Outubro), uma carta de
emprazamento, outorgada pela “subprioresa” do mosteiro de Chelas, Catarina
Anes, a João Esteves, refere o aproveitamento de uma marinha no Lavradio,
“perto de outras de diferentes proprietários, que jazia muito danificada e
lapidada”.
No reinado de D. João I, o
salgado de Lisboa, nomeadamente da margem sul, teria já alguma expressão no reino
pois o sal que aqui se produzia servia para consumo interno e também para
exportação para outros países. Segundo Constantino de Lacerda, “ no reinado do
senhor rei D. João I havia marinhas no Riba-Tejo em tão grande quantidade, que
não somente davam sal para o consumo de Lisboa, mas também era exportado para
fora do reino, o que se prova por um dos artigos, que foram requeridos em
Coimbra ao Senhor rei D. João I por parte dos fidalgos, referidos nas
ordenações do senhor rei D. Afonso V.” 8
Neste
artigo, queixam-se os fidalgos de Lisboa e outros das imposições que o rei
havia lançado sobre o sal, sobrecarregando os exploradores, que desta forma não
tinham qualquer rendimento com o sal que produziam, nem com o seu comércio.
Queixam-se ainda pelo facto de se determinar que, quem tirasse sal de um termo
para outro pagasse três libras por cada moio de sal. Porém, muitas vezes
acontecia que o produto da venda não chegava a render as três libras que
pagavam. Por outro lado, sendo a maioria dos proprietários fidalgos de Lisboa,
teriam que levar o sal do Ribatejo para a dita cidade, para abastecer as suas
casas ou para vender no mercado estando sujeitos a o pagamento das referidas
três libras. Por isso, pedem ao rei para que não sobrecarregue o sal com esta
imposição. 9
Daqui se infere também que era na
região do Ribatejo situada na margem sul do Tejo, que se encontrava o centro
produtor mais importante.
Fonte: Maria Dulce de Oliveira Marques – Dissertação de Mestrado –“O Salgado de Alcochete”
Fonte: Maria Dulce de Oliveira Marques – Dissertação de Mestrado –“O Salgado de Alcochete”
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