20 julho 2006

Ratton



Industrial e negociante da praça de Lisboa; deputado do tribunal supremo da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação; fidalgo cavaleiro da Casa Real e cavaleiro da ordem de Cristo. Sendo francês de nascimento, tornou-se português pela sua naturalização.

Nascera na cidade de Monestier de Briançon, na província do Delfinado, mais tarde departamento dos Alpes, em França, a 7 de Julho de 1736. Faleceu em Portugal cerca de 1822. Era filho único de Jacome Ratton e de Francisca Bellon, natural da mesma cidade.
Pouco depois do seu nascimento vieram seus pais para Portugal e aqui se estabeleceram com uma casa de comércio, de sociedade com Jacome Bellon, seu cunhado, o qual já estava estabelecido no Porto. Depois de fixarem definitivamente em Lisboa a sua residência, mandaram vir o filho, que chegou aqui em 7 de Maio de 1747, e completaram em Portugal a sua educação, toda dirigida no sentido do comércio, cuja teoria e prática conhecia perfeitamente quando, em 1758, seus pais o instaram para casar, visto ser filho único. Escolheu então para sua mulher a Ana Isabel Clamouse, filha do cônsul francês no Porto, Bernardo Clamouse. Pouco depois foi encarregado da liquidação da casa comercial de seus pais e tio, que lha tinham cedido, ao retirarem‑se para França. Desde logo manifestou uma grande actividade e uma arrojada iniciativa, nos mais variados assuntos do comércio, indústria e agricultura. A primeira coisa que projectou foi, em 1764, uma fábrica de chitas, que suscitou o estabelecimento de outras, e depois uma de papel. Em Elvas fundou uma fábrica de chapéus finos, e outra em Lisboa. Em 1789, associando-se com outro francês ilustríssimo Timóteo Lecussan Verdier, fundou a fábrica de fiação de algodões de Tomar, que tanta importância deu aquela terra. Promoveu a criação de outras empresas importantes, para as quais encontrava largo auxílio no governo, que então era o do Marquês de Pombal, sempre tão empenhado em desenvolver a indústria, a agricultura e o comércio da nação portuguesa. Foi em 1762, que Jacome Ratton se naturalizou cidadão português.

Em 1767 tratou de explorar umas marinhas de sal importantes na Barroca de Alva, nas proximidades de Alcochete. Para esse fim aforou uma grande extensão de terrenos incultos, conhecidos pelo Sapal de Pancas; depois enxugou pântanos, saneando lugares onde nunca se criara um homem, fez grandes culturas, construiu uma casa magnífica para sua residência, e fundou finalmente um valiosíssimo estabelecimento agrícola e industrial. Muito dedicado à arboricultura, fez aqui, entre outra outras tentativas, um viveiro de amoreiras brancas de que podia dispor de 12.000 pés. De árvores exóticas plantou neste lugar o primeiro eucalipto que houve em Portugal. A primeira araucária, bela árvore que se admira na quinta dos duques de Palmela, no Lumiar, foi também importada por Jacome Ratton.

Em 1788 foi nomeado deputado da Junta do Comércio e depois fidalgo cavaleiro da Casa Real, recebendo ao mesmo tempo o hábito de Cristo. Vivia tranquilo, respeitado, considerado e feliz, rodeado de seus filhos, escrevendo as suas memórias, quando em 1807 veio a invasão francesa de Junot. É provável que, apesar de se achar naturalizado português, ou não desgostasse de ver tremular aqui a bandeira do seu país, ou pelo menos mantivesse relações amigáveis com os seus ex-compatriotas. Tudo isto é natural. Mas ainda que Jacome Ratton se conservasse completamente afastado do governo de Junot, bastavam o seu nome de estrangeiro, a sua ilustração e o seu espírito naturalmente inclinado às ideias do progresso, para o indigitar como jacobino. Assim o trataram, e foi Jacome Ratton uma das vítimas da famosa Setembrizada. Já em Junho de 1810, por informações que a Regência enviara para o Rio de Janeiro, fora demitido do lugar de deputado da Junta do Comércio, em que esteve durante mais de vinte e dois anos, prestando notáveis serviços.
Na noite de 10 para 11 de Setembro do referido ano de 1810, foi preso para a Torre de S. Julião e transportado cinco dias depois para bordo da fragata Amazona, que o devia conduzir, juntamente com outros jacobinos, para a ilha Terceira, onde chegaram a 24 do mesmo mês. À força de súplicas e de empenhos, conseguira Ratton que lhe permitissem exilar-se voluntariamente para Inglaterra. Passou então para bordo da fragata inglesa Lavinia, a qual tinha seguido a Amazona desde o Tejo até à ilha Terceira, comandada por Lord William Stuart. Ratton, como outros companheiros, tinha passaporte do ministro britânico em Lisboa para passar à Inglaterra, mas os governadores do Reino retiveram esses passaportes e Ratton ainda esteve preso no Aljube de Angra e deveu à diligencia de Lord Stuart o passar sem demora para bordo da Lavinia, que o levou a Portsmouth, donde partiu para Londres. Aqui, junto de seu filho José Luís, que havia pouco fora de Portugal para se estabelecer em Inglaterra, escreveu e publicou, em 1813, a obra intitulada: Recordacoens de Jacome Ratton, fidalgo cavalleiro da Caza Real, cavalleiro da ordem de Christo, ex-negociante da praça de Lisboa, e deputado do tribunal supremo da Real Junta do Commercio, Agricultura, Fabricas e Navegação. Sobre occurrencias do seu tempo, em Portugal, durante o lapso de sessenta e tres annos e meio, aliás de maio de 1747 a setembro de 1810, que rezidio em Lisboa: acompanhadas de algumas subsequentes reflexoens suas, para informaçoens de seus proprios filhos. Com documentos no fim. Londres. Impresso por H. Bryer, Bridge Street, Blackfriars, 1813. Esta curiosíssima obra constitui um volume de 969 páginas, com o retrato do autor desenhado por H. L'Eveque e gravado por J. Vendramini, e uma planta das suas propriedades da Barroca de Alva. É de uma grande importância pela vasta cópia de informações e de esclarecimentos que encerra, tudo acompanhado de reflexões, quase sempre judiciosas, e de anedotas interessantes, relativas principalmente ao governo do marquês de Pombal e à reacção que se lhe seguiu. Não pôs à venda exemplar algum, e limitou-se a brindar com eles os seus amigos. Por morte destes vieram alguns exemplares para o mercado, mas em diferentes épocas parece que houve interessados no seu desaparecimento, tornando-se o livro tão raro quão apreciado. Quando em 1815 se fez a paz geral, pôde Jacome Ratton regressar a Lisboa e acabar aqui tranquilamente os seus dias nos fins de 1821 ou princípios de 1822.
Ainda em 1816 publicara no Investigador portuguez um artigo Pensamentos patrioticos. Imperio luso. Seu filho Diogo Ratton foi feito barão de Alcochete e Inocêncio, no seu Dicionário Bibliográfico, declara não saber se são dele se de seu pai os seguintes opúsculos, intitulados: Reflexões sobre o papel-moeda e Reflexões sobre o commercio e fazenda, publicadas em 1822. Pinheiro Chagas, no seu Dicionário Popular, inclina-se que estes escritos sejam de Diogo Ratton. Jacome Ratton foi ascendente directo do conde de Daupias, um esclarecido industrial, falecido em 1900.

por Manuel Amaral, In Arqnet
Por tudo quanto este homem fez por Alcochete trazendo o progresso, acho que o destaque é merecido...

1 comentário:

Anónimo disse...

viva!

O que aconteceu ao site arqnet? sabe?