05 novembro 2007

Um testemunho





LEMBRO-ME MUITO MAL DA AVÓ ANA
por Maria do Rosário de Fátima de Almeida Lima Quintella

"Tinha dois anos quando ela morreu.
O Pai e a Mãe transmitiram-me uma imagem de alguém que congregava as pessoas à sua volta. Aparece-me como um ponto centrifugador, com certeza que pela atenção e amor que dispensava
aos outros! Em todos os retratos, que o meu Pai (Joaquim Pedro d'Orey Quintella) lhe tirou, a Avó tem uma atitude activa: tem um bebé ao colo, ou mostra livros aos netos ou faz tricot, também para algum concerteza! Devia ser uma boa companheira, porque muitas sobrinhas a adoravam, assim como os irmãos, e muitas vezes passava épocas em casa deles. Os meus pais, que se casaram no mesmo dia que a tia Helena (Maria Helena Oom de Almeida Lima) e o tio Manuel (Manuel Eduardo d'Orey Quintella), dois irmãos com duas irmãs, viveram os primeiros anos de casados na Quinta do Carmo. Fixaram-se depois em Alcochete. Tinha sido formada a S.A.E.S.- Sociedade Agrícola Exploradora de Sal, SARL, hoje SA e o Pai ficara seu administrador. Em Alcochete, a 1ª casa para onde foram morar foi para a casa da marinha dos Pinheirinhos, uma casa muito gira mas completamente sozinha, no meio dos muitos lagos que constituem uma marinha, e cujo único ruído era o piar das aves aquáticas. Hoje os Pinheirinhos fazem parte do Museu do Sal, avistam-se da ponte Vasco da Gama, ainda com a barra azul como outras casinhas de marinha, era a característica da"casa"(1) pela sua tendência monárquica. Na sua época áurea, a S.A.E.S compunha-se de 17 marinhas, cobriam uma área bastante grande que me é difícil calcular. A maior, com uma grande diferença das outras, tinha 400 ha. Cada marinha tinha um marnoteiro e dois criados de marinha, mais os empregados e caseiros das quintas e os feitores seriam uns 57 empregados efectivos. O trabalho nas marinhas era sazonal, começava em Maio e acabava em Outubro, se não chovesse antes. Além da limpeza da marinha, o seu trabalho consistia na rapação do sal, que empregaria uns 150 assalariados à semana e no carrego do sal, que era à jorna, e que consistia em carregar o sal numa canastra à cabeça para os muros das marinhas ou para as fragatas, pois era por este meio que se fazia o seu transporte. O Pai, com muito jeito para a fotografia, encarregou-se de fotografar alguns aspectos desta actividade, os quais apresento alguns exemplares. Foram depois viver para a casa da Vila, hoje casa do Aposento e do Café Barrete Verde. Depois viveram em Vale Figueira. Foi aí que eu apareci! Fui muito renitente em vir a este mundo! Durante sete anos os meus pais marcharam para Fátima no dia 13de Maio! No oitavo ano não conseguiram ir no dia 13. Foram no dia 14! Nasci a 14 de Fevereiro! A avó Ana, já doente, estava atenta aos problemas dos filhos. Nesse 13 de Maio, estando a ouvir, com a minha Mãe a transmissão de Fátima, virou-se para a Mãe e disse:
- Já rezei por vocês e pelo vosso assunto. Com muita convicção e por todas as suas vidas, me consideraram uma graça de Nossa Senhora, daí o nome que tenho. Nasceram depois três manos, o Reguim (Joaquim Pedro de Almeida Lima Quintella), a Mariazinha (Maria Clotilde de Almeida Lima Quintella) e o Paulo (José Paulo de Almeida Lima Quintella). A viver em Alcochete, sem filhos, a Mãe dedicou-se profundamente à Igreja. Reorganizou a catequese, que não havia desde a implantação da República. Daí o Padre Cruz lhe ter ficado imensamente grato. Ainda guardamos os papelinhos que Ele escrevia à Mãe a preparar primeiras comunhões ea agradecer. Também o Pai lhe servia de “chaufeur” para visitar as prisões, preocupação PRIMEIRA deste Senhor. Depois de nascer o meu irmão Reguim já fomos viver para Vale de Mouros, propriedade que ainda temos. Simultaneamente, o tio Xavico (Francisco Xavier d'Orey Quintella), que também tinha vindo para Alcochete, instalava-se em Valbom. Era o pós guerra, as nossas deslocações eram sempre em carros de cavalos. Nessa quinta havia um picadeiro. A "casa" tinha uma criação de cavalos e muitos de nós montávamos.
Para cá chegar era uma viagem comprida e às vezes complicada com marezadas, daí as nossa visitas, nesse tempos, virem para ficar.. Passavam connosco, dias e às vezes meses. Lembro-me que a tia Luisa Quitella, desde Vale Figueira, vinha passar um verão muito prolongado connosco. Os seus últimos 7 anos foram passados em nossa casa e cá morreu. Amigas da Mãe passavam cá semanas!
Os últimos anos de solteira da Isabelinha (prima do lado Quintella) cá foram passados.
Estou a escrever em Alcochete, para onde venho bastante com o meu irmão Reguim. A minha irmã Mariazinha, que Deus já chamou a si, VIVIA imenso esta vida de Alcochete. Adorava festejar os anos com caldeiradas, feitas pelo João Abílio, e vinha muita gente!
Normalmente era domingo e a festa começava com a missa das 11 e meia. Era muito animado.
Sempre que venho para Alcochete, no caminho, sinto-me a voltar à casa mãe! "

(1)"casa" designação que os Alcochetanos
usavam em relação a tudo que era da

Fonte: Revista D´Orey

Foto: CLoia In http://www.olhares.com/CLoia


S.A.E.S

4 comentários:

Anónimo disse...

A autora está a ignorar alguém que dedicou uma boa parte da sua vida á sua familia.....

Assina: ...um seu afilhado

Alcochetano disse...

Caro Anónimo,

Apenas coloquei este testemunho pelas várias referências a Alcochete e devido aos dados apresentados. Não conheço pessoalmente a sua autora e penso que o texto tem um peso histórico sobre o modo de vida Alcochetano nos finais dos anos 40.

De forma alguma posso pronunciar-me sobre as omissões da autora e se esse motivo trouxer debate aberto em comentários futuros, retirarei de imediato o post.

A finalidade do Coisas de Alcochete, é puramente de informação histórica sobre o Concelho de Alcochete. Dar a conhecer Alcochete, tantos aos Alcochetanos, como ao Mundo.

Unknown disse...

Gosto do Bolg,agora é pena publicar a primeira foto que pertençe ao meu Pai sem autorização do mesmo mas paciênçia estamos em portugal.

Rui Mendes

http://www.1000imagens.com/foto.asp?idautor=109&idfoto=205&t=6&g=&p=2

Alcochetano disse...

Caro Rui Mendes,

Apanhei a imagem no Google e achei bonita, julgo que no site onde a retirei nem sequer estava a referencia do seu autor.

Deixo as minha sinceras desculpas, e irei de imediato retirar a foto do meu blog.

Cumprimentos

Alcochetano